terça-feira, 13 de março de 2012

22, vinte e dois - ou a má disposição ou o bilhete só de ida



A triste cidade sai à rua todos os dias dentro de mim. Acorda bem cedo, pelas 6 da manhã para fazer as orações primeiras, ajoelhada contra as minhas costelas. Depois de se queixar de quão aborrecida é dirige-se lenta, em pé, comichosa num movimento repetido e autómato como se de ocupada se tratasse, revolve-me as entranhas estagna na estupidez da catatonia e sorri para o amarelo dos dentes do tempo e da partilha estapafúrdia do vácuo, provoca-me cólicas dolorosas. Regressa, desloca-se às orações do meio-dia, ora em pé ora em comunhão e vê de olhos fechados, causa-me prurido na pele, algum mas profundo.
Retorna sem gás ao automatismo e ao estupor desanimado, com ânsias de orar à bola, orar ao novelo de fios de merda, de orar ao caralho que a foda, sem sucesso, provoca-me um refluxo gástrico violento e violeta à boca. Enfim consegue libertar-se das amarras para se dedicar ao marasmo, sempre e sem excepção, consegue orar a metade do que planeou e satisfaz-se de barriga vazia por que sonhou ver luzes no meio do triste cinzento, porque pareceu-lhe sentir formas no plano cimento, porque lhe deu a impressão de ter ouvido música no ruído de esterco seco que lhe entrou nos ouvidos, porque com nada ou um misto de nada com o inútil lhe pareceu que orou o suficiente, a cidade, a mim fez-me vomitá-la.
De fora de mim engoliu-me porque eu sou uma besta e deixei.
Saio agora todos os dias pela triste cidade, triste a esmurrar-lhe as costelas, fazê-la estrebuchar, vomitar, ganhar pruridos... e ou acorda um dia da tristeza, ou me vomita de vez - para eu nunca mais a engolir.

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