O homem ia a caminhar calmamente na rua e levou com um raio na cabeça.
Caiu como um peso morto no chão. Veio logo uma ambulância buscá-lo. No meio da
viagem foi acordando e ouviu umas frases suspeitas: Foi uma falha técnica; O
sistema mediu mal as coordenadas; Não era suposto isto ter acontecido; Vamos
ser todos despedidos se ele não aguenta.
Acordou ao fim da tarde na cama do hospital rodeado de familiares com um
ar aliviado. Sentiu-se reconfortado mas uma frase de um primo deixou-o com a
pulga atrás da orelha: Continua a festa.
Recuperou e continuou a sua vida normalmente. No entanto foi ruminando
desde início o que tinha ouvido. Passou a acreditar que algo se passava. Que
era especial e de alguma forma vigiado. Que a vida dele fazia depender dele
todas as pessoas no mundo. Sentiu-se um messias, mas ao mesmo tempo, a sua
tendência para a introversão não lhe permitia partilhar nenhuma destas ideias
com ninguém.
Manteve neste limbo. Com a crença de que estava a ser constantemente
vigiado passou a não fazer determinadas coisas que fazia antes: cantar no
banho, falar sozinho, masturbar-se, escarafunchar o nariz, observar os poios
que libertava ao mundo, olhar para os decotes e pernas que deambulavam pela sua
frente, e mais todas essas coisas que tu fazes mas não queres que ninguém
saiba.
Poucos meses depois entrou num convento (embora não tenha encontrado a fé
no deus dos seus parceiros de mosteiro, a sua fé na vigia que tudo sabe levou-o
a esta opção) e viveu uma vida de monge silencioso até ao fim dos seus dias.
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